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Adelto Gonçalves
Página publicada em: 25/05/2015
Jornalista com passagem em alguns dos maiores órgãos da Imprensa de São Paulo, professor univeresitário com doutorado pela USP (Univesidade de São Paulo), especialista em Literatura Portuguesa e Espanhola, autor de ensaios premiados, é também excelente ficcionista, como se pode comprovar neste romance "Os vira-latas da madrugada", um dos livros premiados, em 1980, no concurso de âmbito nacional promovido pela Livraria José Olympio Editora, que o lançou em 1981, e, trinta e quatro anos depois, é reeditado pela LetraSelvagem. "Adelto Gonçalves tem o dom de fazer viver suas personagens, convencendo o leitor de seu valor humano, mesmo quando suas ações, como as de Pingola e Quirino, lhe repugnem", escreveu Maria Angélica Guimarães Lopes, professora emérita da Universidade South Carolina, em resenha publicada na "Revista Iberoamericana", do Instituto Internacional de Literatura Iberoamericana, Universidade de Pittsburg, EUA, janeiro de 1985.
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Adelto Gonçalves nasceu a 16.10.1951 em Santos, cidade portuária do Estado de São Paulo, Brasil. Filho de pais de modesta condição, fez os estudos primários na escola mantida pelo Sindicato dos Operários Portuários de Santos. Com a morte do pai, para continuar os estudos, exerceu pequenos ofícios. Em 1972, quando cursava o segundo ano da Faculdade de Comunicação da Universidade Católica de Santos, iniciou, na mesma cidade, bem-sucedida carreira no jornalismo no jornal “Cidade de Santos” e, em seguida, em “A Tribuna”. Em 1975, vai para São Paulo, onde exerce a função de redator na Editoria de Política & Diplomacia em “O Estado de S. Paulo”. Em 1980, retorna a “A Tribuna”, de Santos. Voltou a trabalhar em “O Estado de S. Paulo”, de 1988 a 1992, depois de uma passagem pela “Revista Placar”, da Editora Abril, em 1987, e pela “Folha da Tarde” (SP), em 1988.
 
Estreou na literatura em 1977, com Mariela morta (contos).
 
Os vira-latas da madrugada foi escrito quando Adelto Gonçalves tinha 18/19 anos e ficou um bom tempo no fundo da gaveta, até ser reescrito em 1977/78. Em 1980, o romance ganhou Menção Honrosa no Prêmio Nacional José Lins do Rego, da Livraria José Olympio Editora, do Rio de Janeiro, e, como resultado da premiação, foi publicado no ano seguinte.
 
Jornalista, escritor, doutor em Letras na área de Literatura Portuguesa e mestre na área de Língua Espanhola e Literaturas Espanhola e Hispano-americana pela Universidade de São Paulo (USP), professor em estabelecimentos do ensino superior e crítico literário, Adelto Gonçalves é, também, autor de vários livros, que vão do ensaio à literatura de ficção. Os viralatas da madrugada é um capítulo especial em sua bibliografia.
 
A história se passa às margens do cais santista com personagens que fazem rememorações da época do tenentismo da Coluna Prestes, passam pela Época Vargas e chegam até o período pré-golpe de 1964, onde efetivamente se passa a narração, e tem como pano de fundo a vida sindical. Em primeiro plano, personagens que vivem entre o bairro Paquetá e a zona central da cidade, região decadente, como decadente é a vida dos personagens que por ali deambulam: ex-sindicalistas, punguistas, jornaleiros, vendedores de jogo do bicho, catadores de restos que caem no transporte antes de chegar aos navios, mendigos, engraxates, cafetinas, cafetões, prostitutas e jovens aprendizes de todo tipo de expediente. Um dos aspectos surpreendentes do romance é a maneira detida, detalhada e verossímil com que o autor tece o enredo, demonstrando total segurança e grande afinidade com o universo existencial e psicológico dos personagens, isso com apenas 18/19 anos de idade, o que leva o leitor a se perguntar sobre o que teria permitido esse prodígio?
 
Em artigo publicado pelo semanário “Jornal Opção”, de Goiânia, nº 2021, de 30.03.2014 a 5.04.2014, e no site do jornal russo “Pravda” (Verdade), em 25.03.2014, intitulado “O golpe visto da janela de minha casa”, Adelto Gonçalves rememora a tenebrosa época em que escreveu o romance e oferece informações sobre a sua vida que, pelo menos em parte, respondem a essa interrogação.
 
O escritor diz, nesse artigo, que, com 12 anos de idade, assistiu ao golpe militar de 1964 da janela de sua casa. A morada de seus pais era no Largo Teresa Cristina, 27, defronte para o prédio do Sindicato dos Operários Portuários de Santos, localizado à Rua General Câmara, cuja lateral direita dava para a praça.
 
Foi por ali que chegaram os soldados da Polícia Marítima, do comandante Seco, ostensivamente armados. Da janela, o menino Adelto viu como alguns daqueles homens de uniforme azul com metralhadoras em punho e longos bastões — que no cais eram mais conhecidos como “pés de mesa” — escalaram o muro dos fundos do sindicato, assumindo posições estratégicas.
 
Depois, ouviu o estilhaçar de uma vidraça do edifício do sindicato, talvez rompida por uma granada de efeito moral ou uma pedra. E, então, percebeu algumas poucas cabeças que se desenhavam nas vidraças: eram os dirigentes do sindicato acuados, provavelmente à espera de notícias que pudessem vir de Brasília sobre um eventual esquema de resistência ao golpe.
Mais tarde, ainda da janela, o menino percebeu uma aglomeração na Rua General Câmara com o Largo. Então, tomou coragem e desceu à rua e viu quando alguns daqueles homens que estavam acuados na parte de cima do sindicato desceram as escadarias, sob a mira de metralhadoras, e entraram numa espécie de “corredor polonês” aos tapas e pescoções em direção a um caminhão coberto. Entre eles, lembra-se de ter visto Manoel de Almeida, que era o presidente do sindicato, e Rafael Babunovitch, diretor. Com outros diretores e alguns associados solidários, seriam conduzidos para o navio-prisão, que por muitos dias ficaria ancorado em frente ao porto de Santos com sua presença ameaçadora, tal como uma forca na praça principal de uma pequena cidade.
 
Adelto diz, ainda, não saber por que aqueles acontecimentos se davam, mas a sua solidariedade era para com aqueles que eram agredidos a caminho do caminhão. Em 1961, havia se formado na escola primária do Sindicato dos Operários Portuários, com 10 anos de idade. Ingressara na escola não porque seu pai trabalhasse na Companhia Docas, mas porque ela ficava perto de casa e um amigo da família, portuário, havia se proposto a apresentá-lo como seu sobrinho, de modo que houve um arranjo para superar as normas, já que a escola, a princípio, só poderia ser cursada por filhos de portuários. E o pai de Adelto era dono de um pequeno armazém de conserto de sacaria de café na Rua Tuiuti, 34, na beira do cais do Valongo.
 
Adelto saiu daquela escola como um de seus melhores alunos. Ao final de 1961, o então presidente da República, João Goulart (1919-1976), fez uma visita ao sindicato e, na ocasião, cumprimentou uns três ou quatro daqueles alunos que haviam recebido medalha de aplicação ou de honra ao mérito. Adelto foi um deles. Diz lembrar-se, até hoje, do cumprimento dado pela mão suarenta do presidente.
 
Naquele ano de 1964, Adelto Gonçalves cursava o segundo ano ginasial no Colégio Comercial Coelho Neto e assistira, indiferente, à pregação de uma professora que costumava angariar adeptos para as manifestações que a União Cívica Feminina organizava contra o governo Goulart. Até porque não nutria nenhuma simpatia por aquela gente.
 
Por acaso, também sem sair de casa, o menino Adelto conhecera o prefeito de Santos, José Gomes (1920-1974), que teria o seu mandato cassado depois do golpe: via-o frequentemente cruzar o Largo Teresa Cristina em direção à Rua General Câmara a caminho de seu trabalho na Rádio Cacique, onde apresentava um programa. Certa vez, o prefeito, com seu cabelo ruivo e voz tonitruante, parou à janela do porão da casa de Adelto encantado com a vitalidade de seu cachorro, o Rick, e fez-lhe algumas perguntas a respeito do cão.
 
Era natural que, anos mais tarde, quando Adelto tinha 17 ou 18 anos de idade e sentou-se para escrever num caderno escolar os primeiros apontamentos para o romance Os vira- latas da madrugada, ainda no porão daquela casa do Largo Teresa Cristina, se sentisse impulsionado por muitas dessas lembranças. Tanto Almeida como Babunovitch, “o homem de bochechas vermelhas” e que “parecia ter uma batata quente na boca quando falava”, são personagens que aparecem disfarçados, ao lado de tantos outros, naquele romance que reescreveu, dez anos mais tarde, à época em que era subeditor de Política na redação do jornal “O Estado de S. Paulo”.
 
O trabalho, a um tempo de memória e pesquisa, presente em Os vira-latas da madrugada, fez com que o jornalista e escritor Marcos Faerman (1943-1999), professor na tradicional Faculdade de Jornalismo Cásper Líbero, apaixonado pelo “jornalismo literário” e estudioso da relação entre o texto jornalístico e as técnicas narrativas, enquadrasse a obra na categoria “romance-reportagem” e indicasse-a numa lista de cem livros de leitura obrigatória a alunos de jornalismo ou postulantes ao ambicionado mas difícil ofício de “escritor”.
A lista de Marcos Faerman é encabeçada por A sangue frio (Truman Capote) e contempla outras obras-primas da literatura universal, como, por exemplo, Honrados mafiosos (Gay Talese, 2º da lista), Décadas púrpuras (Tom Wolfe, 5º), México rebelde (John Reed, 7º), Casa de loucos (João Antonio, 9º).
 
Os vira-latas da madrugada aparece em 10º lugar nessa lista, antes de clássicos como Moby Dick (Herman Melville, 11º), A ilha do tesouro (Robert Louis Stevenson, 12º), O lobo do mar (Jack London, 13º), Recordação da casa dos mortos (Dostoiévski, 22º), Tempo de morrer (Ernest Hemingway, 27º), Nada de novo no front (Erich Marie Remarch, 28º), A peste (Albert Camus, 29º), As vinhas da ira (John Steinbeck, 34º) e David Corpperfield (Charles Dickens, 37º).
 
Ainda no texto do “Jornal Opção” e do “Pravda”, Adelto relembra um fato que marcou a publicação da 1ª edição de Os vira-latas da madrugada e que só agora, trinta e quatro anos depois, o público tomará conhecimento do mesmo por inteiro, ganhando esta 2ª edição um significado novo, de verdadeiro ato insurrecto contra a castração das liberdades promovida pelos regimes totalitários — pois, como se verá, o Os vira-latas da madrugada foi uma das tantas vítimas da ditadura militar que à época infelicitava o nosso país.
 
Vamos ao fato:
 
Lançado na sede da editora no dia 30 de abril de 1981, juntamente com outras obras premiadas pela comissão julgadora, o livro trazia um prefácio no qual o jornalista Marcos Faerman dizia que aquele “romance de sons delicados e histórias tristes” não agradaria “àqueles que venceram em 1964”. Àquele lançamento coletivo estiveram presentes os ex-ministros Darci Ribeiro (1922-1997) e Eduardo Portela, o compositor Tom Jobim (1927-1994), cuja irmã Helena ganhara o prêmio principal do concurso, e ninguém menos que Luís Carlos Prestes (1898-1990), o Cavaleiro da Esperança, por sinal, também personagem ocasional de Os vira-latas da madrugada.
 
Adelto relembra que, naquela noite, “houve uma bomba que explodiu no RioCentro antes da hora e fez gorar uma tragédia que poderia ter provocado muitas vítimas.”
 
Esse episódio, provavelmente, somado às dificuldades financeiras que puseram a editora sob intervenção do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), foi a causa de a edição ter sido recolhida à gráfica e o livro distribuído sem o prefácio.
 
Trechos do prefácio de Marcos Faerman foram publicados no semanário “Movimento” (São Paulo, edição de 1 a 7 de junho de 1981, página 15), com o título “Horror na beira do cais” e a seguinte linha final: “Trechos de um prefácio censurado, sobre tempos nublosos...”. Na abertura, em texto que se pode atribuir à redação, lê-se: “O porto de Santos foi palco de grandes manifestações de massa nos anos que precederam a deposição do presidente João Goulart, em 1964, por isso mesmo, assistiu à violenta repressão depois do golpe militar de abril. Essa história constitui o pano de fundo do romance Os vira-latas da madrugada, do jornalista Adelto Gonçalves, recentemente publicado pela Livraria José Olympio Editora. Tudo indica que os acontecimentos posteriores ao golpe militar ainda incomodam aqueles que, de uma forma ou de outra, foram responsáveis por eles. Assim, Os vira-latas da madrugada, publicado por uma editora que está sob intervenção do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico (BNDE), acabou saindo sem o prefácio que fora preparado pelo jornalista Marcos Faerman, embora tenha sido impresso e encadernado normalmente. Ele teria sido proibido por ordem direta do interventor militar na editora, e foi arrancado de todos os exemplares. O prefácio foi vetado por problemas técnicos. Essa foi a explicação do editor Ivan Cavalcanti Proença, que prometeu uma nova edição, em alguns meses, incluindo o prefácio. Entretanto, apesar de desmentir qualquer conotação política no veto, Proença faz questão de frisar que a José Olympio é uma editora em situação peculiar, insinuando que a intervenção do BNDE não lhe permite total autonomia operacional.”
 
Como prova da auto-censura, um exemplar com o prefácio “subversivo” foi guardado por Adelto Gonçalves.
 
Seguindo o ideário ético filosófico de Fernando Pessoa, para quem “a função da arte é revelar o oculto e elevar a alma acima de tudo que é mesquinho”, a LetraSelvagem resolveu reeditar Os vira-latas da madrugada, cuja 1ª edição encontra-se há décadas esgotada, dando às novas gerações de leitores a oportunidade de acesso a essa narrativa realizada com técnica e alma, recolocando em seu merecido lugar o censurado prefácio de Marcos Faerman, o qual, da gaveta onde os inquisidores o sepultaram, clamou para vir à luz, não como explosão de pólvora e chumbo a amedrontar cidadãos indefesos, como fazem as ditaduras, mas como um potente raio, descarga de luz, irretorquível libelo capaz de ferir insensibilidades e despertar consciências.
 
Adelto Gonçalves é autor, entre outros, de Fernando Pessoa: a voz de Deus (Santos, Editora da Universidade Santa Cecília, 1997, ensaios e artigos), Barcelona brasileira (Lisboa, Nova Arrancada, 1999, romance; São Paulo, Publisher Brasil, 2002), Bocage — o perfil perdido (Lisboa, Caminho, 2003, ensaio biográfico) e Tomás Antônio Gonzaga (Rio de Janeiro, Academia Brasileira de Letras/Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 2012, ensaio biográfico), entre outros. Em 1986, obteve o Prêmio Fernando Pessoa da Fundação Cultural Brasil-Portugal, do Rio de Janeiro, participando do livro Ensaios sobre Fernando Pessoa com o trabalho “O ideal político de Fernando Pessoa”, publicado também em Fernando Pessoa: a voz de Deus. Conquistou os prêmios Assis Chateaubriand de 1987 e Aníbal Freire de 1994, ambos da Academia Brasileira de Letras. Seu trabalho de doutorado Gonzaga, um poeta do Iluminismo, sobre Tomás Antônio Gonzaga (1744-1810), publicado em 2000 pela Editora Nova Fronteira, do Rio de Janeiro, ganhou o Prêmio Ivan Lins de Ensaios da União Brasileira de Escritores e da Academia Carioca de Letras.
(Texto publicado como Nota do Editor na reedição de Os Vira-latas da madrugada realizada pela LetraSelvagem).
 
 

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